| Dirty Mind é um jogo sobre os meios mínimos: o
            de um curto registo sonoro de uma voz emitida em looping através de uma coluna de som e o
            de uma persiana vermelha em pvc. Mais seria de facto menos nesta obra de
            inspiração minimal cujo efeito reside tão simplesmente na repetição sonora das frases
            que lhe reforça o centripetismo do espaço e o efeito de contracção do espectador, e ao
            qual se vem associar uma persiana vermelha que se entreabre ligeiramente como que
            permitindo uma brecha para um olhar. Colocados estes media em contraposição no espaço,
            a nossa posição é a própria de uma instalação, a do meio. Aqui vemos a linha
            de transparência da persiana e compreendemos que não está ali para nos servir, mas para
            sermos objecto do nosso próprio papel. Não funciona como uma janela ou fechadura de uma
            porta, a sua abertura é espectral, dobra-se na nossa direcção e apanha-nos. Apanha-nos na inquietude de estarmos a ser observados, de a obra nos
            devolver essa posição milenar que com ela mantivémos, de nos vermos confrontados com a
            descrição de um comportamento que é muitas vezes o nosso enquanto espectadores, de
            sentirmos afinal neste zigue-zague uma «falta de espaço»- expressão paradoxal de uma
            sensação que aqui não nasce porém das condições espaciais apresentadas mas do facto
            da nossa posição ser instabilizada e de nos sentirmos em causa, interrogados.
            «Falta de espaço» é sobretudo o reenvio moderno do espectador para uma outra
            condição, a da instrospecção quase espectral, e para, afinal, a própria experiência
            de se ser espectador. Em causa a recepção estética própria àquele que, como a
            voz denuncia, entra, aproxima-se, sai e desaparece. Atarefado, induzido pela pressa de
            tudo ver, pelo hábito de ser sujeito distraído. A designação Dirty Mind associar-se-á aqui 
                    também aos hábitos voyeuristas do homem moderno compactado 
                    nas multidões da cidade mas diferido das experiências dos 
                    outros, e por vezes das suas. A esse olhar multidireccional, 
                    quase sempre cativo das máquinas e dos equipamentos da imagem, 
                    se vem dar aqui resposta através da inacessibilidade e total 
                    ausência de imagens exteriores, até porque o equipamento ou 
                    não funciona como seria devido, como é o caso da persiana, 
                    ou, como é o caso do registo sonoro, reitera incansavelmente 
                    o próprio acto de ver do «vigilante», aprisionando-o em jeito 
                    de Medusa nas suas próprias armas. «Dirty Mind» é por 
                    isso e antes de mais uma acusação, mas que aqui servirá também 
                    o ofício de ser um veículo para uma punição. Victor M. E. Flores 
 
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