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  Dancer in the Dark

  [ José Gil ]

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Filme que produz "mixed feelings", em todos os sentidos. Porque o autor quis misturar registos heteróclitos e contraditórios de emoções, atmosferas, estilos. E não conseguiu: o resultado é incerto, irregular, suscitando admiração, indiferença, nem sempre surpresa, raramente adesão.

O talento de Lars von Trier é indiscutível. Mas não basta o talento para contrabalançar a pulsão profunda que faz brotar as sensações preferidas de um autor. A coexistência de dois regimes de imagens, um feérico, maravilhoso, irreal - como o dos "musicais" americanos -, o outro realista, às vezes mesmo naturalista - como o das cenas de fábrica e da vida quotidiana das personagens - não funciona, oscilando sempre em disjunção (ora num, ora noutro: num dos planos finais em que Bjork começa a cantar já não em sonho, mas na cela do enforcamento real, não salva o filme desta falha essencial). Isto gera às vezes inverosimilhanças no guião que, não sendo importantes, são sempre aborrecidas.

Sobretudo, quando o quadro geral da estória é um melodrama. Aí, o realizador dá largas à sua pulsão do patlios -- do patético. Um patético impuro e excessivo, que poderíamos qualificar de lírico (o que o pode tornar aberrante). Seria preciso mais do que talento para conseguir no excesso o que exigiria mais naturalmente o fino, o imperceptível. Em Lars von Trier, o resultado é um regime mórbido de forças e emoções. Ri-se com lágrimas, sonha-se e dança-se no meio da tragédia. O que poderia ser óptimo e poderoso. Mas aqui é a vertigem em escala macro. Até a câmara treme para que nós, espectadores, também nos sintamos quase cegos, como a personagem principal. Mas apenas atingimos o limite da visibilidade cinematográfica.

Conclusão: Dancer in the Dark é um filme talentoso que joga com uma ambiguidade perversa das emoções (que não é salva pela técnica, talvez mesmo pelo contrário: é ela que a faz falhar): o autor excita-se demasiado com o sofrimento - o que é sempre suspeito, mesmo por boas causas (contra a pena de morte, por exemplo). Bom para quem goste.